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Poema inédito

TUDO BEM

está tudo bem, meu bem
eu sei porque eu vi na tv

está tudo legal a nível nacional
eu sei porque eu vi no jornal

a vida é bagatela, minha bela
eu sei porque eu vi na novela

está tudo como sempre esteve
eu sei porque não teve greve

está tudo perfeito
eu sei, votei pra prefeito

está tudo bem com a gente, minha gente
você sabe, vamos votar pra presidente

está tudo bem não se preocupe
digo isso pra que você não se culpe

está tudo conforme os planos
não faz mal, a gente sempre passa um pano

eu sei que você tem passado fome
fome é vida, não reclame

não faz assim, tá querendo colo?
está tudo dentro do protocolo

eu sei que você tem passado por crises
não pense em crise, take it easy

porque está tudo bem, meu bem
eu sei, eu vi na tv

está tudo legal a nível nacional
eu sei, passou no jornal

e amanhã há de ser outro dia
é carnaval, pessoal

o país vai acordar de repente
numa chuva de confetes

você não pressente?
você não pressente?

vai dar tudo certo, Maria
esse país vai despertar

na mais serpentina harmonia

*
Leo Gonçalves

(publicado dia desses em A voz pública da poesia)

hoje eu decidi fazer um soneto

hoje eu decidi fazer um soneto.
do meu jeito, não tenho pretensões
de ser vinicius, mattoso ou camões.
hoje eu decidi fazer um soneto.

em segredo: vai que surgem espiões
da cia ou qualquer serviço secreto
ou mesmo um escritor analfabeto
querendo engalobar meus palavrões.

ou pior: vai que um crítico perverso
depois de escarafunchar o meu verso
encontre mensagens subliminares.

não. por isso eu o fiz e logo
deletei dei logout lancei fogo
e fui pra rua ver os malabares.

(leo gonçalves)

release: lançamento do livro WTC BABEL S. A. de leo gonçalves

O poeta belorizontino Leo Gonçalves lança nesta próxima segunda-feira, dia 19/01 às 19h o seu poema WTC BABEL S. A., com apresentação da performance “no fundo todos querem alcançar o céu” e noite de autógrafos

Primeiro livro do selo “Edições Barbárie”, WTC BABEL S. A. será lançado na próxima segunda-feira. No ato do lançamento, o poeta Leo Gonçalves apresenta a performance “no fundo todos querem alcançar o céu” e em seguida, haverá noite de autógrafos. O evento acontece na Cia. da Farsa (Rua Caetés, 616 – Centro)

WTC BABEL S. A., poema que dá título ao livro (lançado em formato plaquete), é um contundente grito de protesto contra os abusos ocorridos na política do presidente George W. Bush (que estará cumprindo nessa segunda-feira o seu último dia de mandato). Resultado de experimentações formais feitas por Leo Gonçalves, WTC BABEL S. A. é um poema híbrido, repleto de imagens do mundo contemporâneo, Imagens que vão da sátira mordaz ao mais vivo grito por um mundo mais humano.

Comenta o crítico mineiro Fábio Lucas: “WTC BABEL S. A. é um poema-apelo a clamar pelos olhos abertos e pelos ouvidos atentos, a fim de bem colher as imagens do mundo cruel, travestido em boletim publicitário. A linguagem multi-centrada em vários idiomas representa valiosa sátira da subcultura globalizada, que ensina o culto de bezerros-de-ouro plantados nos recantos do planeta”.

Para o Ato de lançamento, o poeta aposta na força da palavra falada e prepara a perfornance “no fundo todos querem alcançar o céu”, na qual ele falará o poema acompanhado de sua parafernália visual.

Leo Gonçalves (33 anos) é poeta, tradutor e ensaísta. Autor do livro “das infimidades”, vem publicando em diversos jornais e revistas do Brasil. Traduziu a comédia “O doente imaginário” de Molière (livro que teve sua segunda edição em 2008 pela editora Crisálida), o livro de poemas “Canções da Inocência e da Experiência” de William Blake (em parceria com Mário Alves Coutinho e também publicado pela editora Crisálida, 2005) e o livro “Isso”, do poeta argentino Juan Gelman (em parceria com Andityas Soares de Moura, publicação da editora UnB, 2004).

O lançamento ocorrerá no espaço da Cia. da Farsa, companhia de teatro dirigida por Alexandre Toledo. Situado na Rua Caetés, 616, no centro da cidade, o espaço promete excelentes acontecimentos culturais para o ano de 2009.

Orelha do livro:
“Se o “poema falado” não é um conceito novo, com WTC BABEL S. A., Leo Gonçalves inaugura o “poema gritado”. Através de um hábil manejo da língua (ou das línguas), elabora uma ácida e irônica crítica ao governo norte-americano. Crítica que serve como eixo a mover os fios de um mundo desbaratado. Rebela-se diante deste mundo inventado e desafia também a métrica, através de um texto cujo único fim é o de mover o leitor-ouvinte, que a partir desse mesmo instante se converte em protagonista do poema que, em essência, não é outra coisa senão uma manifestação clara e corajosa do amor pela vida acima de tudo”. (María José Pedraza Heredia)

Serviço:
Lançamento do livro WTC BABEL S. A.
Local: Cia. da Farsa – Rua Caetés, 616 – Centro
Dia 19 de janeiro de 2009 às 19h

contatos:

leo gonçalves: 31 9824 5939
jéssica gonçalves: 31 8463 1269

Um não-poema de Heriberto Yépez

Daniel não curte o latex
diz que com a muralha
de uma única pele
já é mais que o suficiente.

Quanto a mim, acho
que não há invenção
mais fabulosa do que a camisinha:

é o primeiro invento humano
que realmente nos protege
dos terríveis efeitos
e venenos próprios do amor.

(Tradução: Leo Gonçalves)

A Daniel le molesta el látex/dice que con la muralla/de una sola piel/ya es más que suficiente.//A mí, en cambio, me parece/que no hay invención/más fabulosa que el condón://es el primer invento humano/que realmente nos protege/de los terribles efectos/y venenos propios del amor.

Este não-poema é um capítulo do romance 41 closets

41closets

jerome rothenberg aqui & ali

(aproveitando uma dica do heriberto yepez)

há bem pouco tempo que venho me enveredando pelos estudos da etnopoesia. acho lamentável não encontrar muitas fontes sobre o assunto em língua portuguesa. fiquei bem feliz quando encontrei numa livraria um livro chamado “etnopoesia no milênio”, da editora azougue. da mesma forma, passeando pelo incrível site do ubu, encontrei um excelente manancial (coordenado pelo próprio jerome) sobre a ethnopoetics, oferecido para os leitores de língua inglesa. foi lá que achei o “sketch on ethnopoetics” de heriberto yepez para traduzir.

acredito muito numa poesia que chamarei “de pesquisa”, a qual encontro as primeiras prefigurações no brasileiro sousândrade, nas galáxias de haroldo de campos e em jerome rothenberg.

rothenberg é mais um que entra para a bloguesfera. ele lança seus delírios de lá da california no poems & poetics. no prospecto que ele inseriu na barra ao lado de seu espaço, um pouco daquilo que os blogueiros dizem ou diriam se tivessem lembrado de fazê-lo.

nesta era de internet e blogue, abre-se a possibilidade para uma livre circulação de obras (poemas e poéticas no nosso caso) para além de um nexo comercial ou acadêmico. eu passarei a postar algumas das minhas próprias obras, tanto novas quanto velhas, de difícil ou impossível acesso, e também, como der na telha, postar obras de outros meio à maneira de uma antologia ou revista aberta. eu tomo isto para estar na tradição dos poetas de publicação autônoma, retornando a Blake & Whitman & Dickinson, entre numerosos outros.

o poems & poetics está no:
www.poemsandpoetics.blogspot.com

além disso, você encontra mais sobre a ethnopoetics no:
www.ubu.com/ethno

sociedades do espetáculo

o livro “la societé du spectacle” teve sua primeira edição em 1967, o ano em que a terra estava em transe. nos anos seguintes, guy debord, seu autor, pôde confirmar muitas das coisas que ali estavam profetizadas (fico imaginando o que ele diria hoje, depois do espetáculo do world trade center, das campanhas eleitorais de países como o brasil e os estados unidos ou da espetacularização do assassinato de crianças, transformando os criminosos em verdadeiros astros pop às avessas).

em 1988, pensando nisso, ele escreveu os “comentários à sociedade do espetáculo”. foi por essa época que saiu na itália o livro “la societá dello spetacolo”, com posfácio entitulado “Glosas marginais aos “Comentários sobre a sociedade do espetáculo”” de giorgio agamben. texto inédito em livro no brasil. agora traduzido por joão gabriel e disponível no blogue dele: l’autre nom.

no texto, o filósofo italiano comenta coisas como o acontecimento de timisoara, à época do fim do regime comunista na romênia (“pela primeira vez na história da humanidade, cadáveres recentemente enterrados ou alinhados sobre as mesas dos necrotérios foram exumados rapidamente e torturados para simular diante das câmeras o genocídio que deveria legitimar o novo regime”.) e a legitimação de um estado espetacular (ou democracia-espetacular). deixo com vocês uma palhinha:

pela primeira vez na história do século, as duas grandes potências mundiais são dirigidas por duas emanações dos serviços secretos: bush (antigo chefe da CIA) e gorbatchov (o homem de andropov); e mais eles concentram o poder em suas mãos, mais isto é saudado, pelo novo ciclo do espetáculo, como uma vitória da democracia. a despeito das aparências, a organização democrática espetacular mundial que se desenha assim corre o risco de ser, na realidade, a pior tirania que jamais foi conhecida na história da humanidade, por relação a qual toda resistência e oposição se tornarão mais difíceis, visto que assim ela terá por tarefa administrar a sobrevivência da humanidade para um mundo habitável pelo homem.

giorgio agamben, 1991

cordel do fogo encantado, joão cabral de melo neto e os bonecos

“o amor comeu meu nome, minha identidade, meu retrato. o amor comeu minha certidão de idade, minha genealogia, meu endereço. o amor comeu meus cartões de visita. o amor veio e comeu todos os papéis onde eu escrevera meu nome.

joão cabral de melo neto

no último sábado, na praça da estação, a coisa ficou bonita. eu e a patrícia fomos ver o sesi bonecos do brasil. nunca tínhamos visto um show do cordel do fogo encantado e fiquei impressionado. música de qualidade, muita gente bonita, muita dansa, muita poesia e muita alegria tudo junto no mesmo horário e no mesmo lugar.
só um comentário: joão cabral nunca podia imaginar que o poema dele seria falado por uma banda de rock’n roll, em plena praça da estação, pra uma platéia repleta de jovens e adolescentes. saravá lirinha!

o sábia no sertão,
quando canta me comove,
passa três meses cantando
e sem cantar passa nove
porque tem a obrigação
de só cantar quando chove