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retrospectiva 2008, augúrios de um 2009 de êxitos e grandes encontros

salamalandro no redezero. swedenborg acessível para leitores brasileiros. iemanjá. humano demasiado humano. carne viva (marcelo sahea), das infimidades e outros livros disponíveis de graça em pdf para os vivos que quiserem se deleitar. “se as portas da percepção fossem limpas, tudo apareceria ao homem tal como é: infinito” (w. blake). poesia, magia e política: léopold sédar senghor. não macule a minha faca: letícia féres, julius e frederico pessoa. “como era gostoso o meu francês”, um filme de nelson pereira dos santos (1972). heriberto yepez: por uma poética antes da propaganda e depois do paleolítico. a etnopoesia de jerome rothenberg. o rei da vela revisitado. manifesto antropófago: 80 anos. homenagem a aimé césaire e comemoração do centenário do poema “navio negreiro” de castro alves. o doente imaginário (2ª edição revista e recriada). o vôo deslocado de “algo indecifravelmente veloz”. lira (laboratório interartes ricardo aleixo/liga de invenção da resistência ativa). fabiana cozza na noite do griot. renascimento do samba em bh. lançamento do disco ana da titane. maría josé pedraza heredia. “perdão mútuo de cada vício, eis os portais do paraíso” (w. blake). bh tão ítaca. a utopia brasileira e os movimentos negros, livro de antônio risério. livraria usina das letras. ricardo silveira e seu projeto poema passageiro. ibrahima gaye, cônsul honorário do senegal em belo horizonte. encontro mundial do slow food, em turim. barack obama, presidente dos u. s. a. revista roda nº6 – arte e cultura do atlântico negro allen ginsberg. “a raiz das palavras é a garganta de quem as pronuncia”. (benjamin abras e leo gonçalves). edições barbáriefestival do choro livre em bh. “vento nos cabelos pés no chão”. um novo norte. WTC BABEL S. A.

um vôo rápido sobre os bons achados de 2008. com e sem cifra. vai em ordem cronológica. se fosse em ordem de importância, a linha melódica seria outra. as tristezas não precisam aparecer aqui: ficaram para trás, deixarão de existir. os que se tornaram ancestrais, nos orgulhamos deles e agradecemos sua passagem iluminada tão perto de nós. nem vou falar dos amigos, que se começar não paro mais. tem quem merece destaque todo especial, mas esses já estão sabendo. 2008 teve seus momentos difíceis, sim, mas também teve excelentes momentos. tudo isso indique que o próximo ano será melhor. muito melhor. faremos o possível. avise à sereia que o impossível também.

sobre um embaraço muito comum

a verdade é que ninguém pode obter de outra pessoa uma confirmação segura do valor daquilo que escreve. é-se poeta a despeito desse fato, ou não se é poeta. (antônio cícero)

não sou um poeta conhecido. não tenho muitos livros de poesia publicados. mesmo assim, muita gente me admira e eu sou muito grato a essas pessoas. muita gente espera de mim certos comentários e respostas sobre a validade dos seus poemas. agradeço muito que me tenham em tão alta conta. às vezes fico embaraçado, não sei o que dizer, mesmo quando estou diante de excelentes poemas. a algumas pessoas eu gostaria de dar uma resposta que ajudasse a deslanchar. às vezes eu até tento. acho arriscado. mas chego a tentar. não sei se devia.

outro dia, passando pelo blogue do antônio cícero, encontrei uma postagem que responde a muito do que eu gostaria de dizer a essas pessoas. sobre poemas enviados a poetas

casa áfrica daara – curso de línguas

daara é uma palavra da língua wolof que significa “lugar onde se adquire o conhecimento”. o centro cultural casa áfrica inaugura no dia 04 de agosto o seu curso de línguas. começaremos nesse segundo semestre de 2008 com os cursos de inglês e de francês. este último terá por professor o leo gonçalves (este salamalandro que vos fala). turmas reduzidas, preço módico e cultura do universal, eis o nosso convite. a casa áfrica fica na rua leopoldina, 48 – bairro santo antônio. pertinho da vaca. para se matricular ou pedir mais informações, é nos segintes números: (31) 3234 5939 (escritório da casa áfrica), (31) 3344 1803 (centro cultural casa áfrica) ou comigo, no 9130 3720. ou então deixe aqui o seu comentário que eu responderei.

Fahrenheit 451

Existe mais de uma maneira de queimar um livro. E o mundo está cheio de pessoas carregando fósforos acesos. Cada minoria, seja ela batista, unitarista; irlandesa, italiana, octogenária, zen-budista; sionista, adventista-do-sétimo-dia; feminista, republicana; homossexual, do evangelho-quadrangular, acha que tem a vontade, o direito e o dever de esparramar o querosene e acender o pavio. (…) Beatty, o capitão dos bombeiros em meu romance Farenheit 451, explicou como os livros foram queimados primeiros pelas minorias, cada um rasgando uma página ou parágrafo desse livro e depois daquele, até que chegou o dia em que os livros estavam vazios e as mentes caladas e as bibliotecas para sempre fechadas.

discutindo futebol

eu estava trocando idéias com meu amigo anderson almeida sobre um capítulo de a utopia brasileira e os movimentos negros, em que antônio risério fala apaixonadamente do futebol brasileiro. lá, ele cita um trecho de nelson rodrigues e o anderson veio sugerir que suprimisse a palavra jogador. boa idéia:

A pura, a santa verdade é a seguinte: qualquer jogador brasileiro, quando se desamarra de suas inibições e se põe em estado de graça, é algo de único em matéria de fantasia, de improvisação, de invenção. Em suma: temos dons em excesso. (nelson rodrigues)

comentário do anderson: “conclusão: não precisamos de mais criatividade, precisamos de menos inibição”. sábias palavras.

leonardo costa braga: photo-poesia

leonardo costa braga, além de um grande amigo, sempre foi o meu fotógrafo favorito. ele participou, no último ano do 14º. salão da bahia, no mam, além de ter mandado suas fotografias para ser vistas na eslovênia, espanha, brasília, portugal e porto alegre, alemanha e rio de janeiro. há algum tempo atrás, ele publicou na revista caros amigos esse texto abaixo. e eu o reproduzo aqui com banzo das nossas antigas conversas nonsense enquanto assaltávamos o mundo com poesia em plena quarta-feira. saravá-evohé, leo!

TEMPO VIVO
por Leonardo Costa Braga

O Walter Firmo me pediu que escrevesse sobre a ilusão do meu olhar (falou isso como se estivesse me fotografando). Então confirmo o que ele viu, no ato e na palavra: photo-grafien (luz-escrita). Por isso, a criança e sua luz acusando a vida no corpo, alegria da célula dançando, explosão que nem a bomba de Hiroxima conseguiu apagar. Por isso, o velho e sua luz de dentro, seiva tão bela de tristezas que faz a árvore crescer, a delicadeza da compaixão de ainda estar junto de alguém. Por isso, a mãe que dá à luz, manuscrita do grito de amor que repercute na escravidão do universo. Sendo assim, fica muito difícil photo-grafar o adulto. Não está acordado nem dormindo, parece que está sonhando, como nos filmes do Kurosawa. Mas tento tirar uma photo, que geralmente vira um xerox. Uma cópia da realidade. Uma falsificação. Não brilha. E a photo-grafien, ao contrário do que se diz, não é uma imagem estática, é a certeza de que o tempo está sempre vivo, te olhando e esperando ser olhado. Com isso, lembro quando tinha 7 anos de idade, correndo na casa da minha tia e parando em frente a uma grande photo-grafien na parede: uma cadeira de balanço, um velho negro sentado, um saxofone, uma árvore. Um instante depois: um velho negro chorrindo baixinho e uma árvore deixando cair sua primeira semente no meio da sala onde me encontrava. A luz. A escrita. Minha ilusão.

Notas para uma genealogia

Nunca fui muito chegado a árvores genealógicas. Trabalhei vários anos em livrarias. Do lado de trás do balcão, ouvi muita gente maluca dizer que estava recompondo a lista de seus ancestrais. Lembro-me de uma senhora que procurava um livro de heráldica. Ela queria ter um modelo do brasão da família, que tinha suas orígens alem-mar e que teria chegado dos portos portugueses em grandes caravelas. Não me lembro bem o sobrenome, deve ser algo como “silva” ou “andrade”, sei lá. Eu olhava a tudo com um suspeitoso interesse e ela me perguntou: “você já fez a sua árvore genealógica?” ao que respondi: “não há muito o que procurar”. Depois de saber que o meu sobrenome era Gonçalves ela me disse a queima-roupa: “você certamente é de origem espanhola, com esses traços árabes… procure saber”.

Sempre me pareceu, então, que as pessoas interessadas nesse tipo de genealogia estavam mesmo é procurando um jeito de levantar a auto-estima, adivinhando supostos ancestrais ilustres que corroborassem a existência moral dos que aqui estão. E, é claro, para que isso acontecesse, o antepassado deveria forçosamente vir da europa ou quando muito um árabe ou um judeu. Indígenas não. Nem africanos, que só servem pra sujar o sangue da família. Ou seja: o que eu iria procurar?

Mas recentemente, motivado por minhas leituras em torno a questões étnico-raciais, resolvi escarafunchar. O objetivo é tentar chegar o mais perto possível do que teria sido a minha origem biológica. Filhos de quais povos teriam se unido para chegar até isso que sou? Comecei a pesquisa de modo simples: entrevistando meus pais. Em seguida, pretendo entrevistar outras pessoas da família e depois ir às cidades onde nasceram alguns dos nossos antepassados em busca de documentos, matrículas, registros de nascimentos e de aquisição de escravos, notícias de imprensa, coisas que apontem para alguma informação mais clara.

Já tenho alguns apontamentos: meu avô paterno, Vitalino Francelino Gonçalves, nasceu em Santo Antônio do Monte, Minas Gerais. Reza a lenda que era neto de índios. Mas não sabemos de qual etnia eram e nem se a informação é verdadeira. De qualquer forma, flagro o velho lá em Abaeté (cidade natal de meu pai) sobrevivendo, em meio a diversas atividades do campo, de seu artesanato em cambaúba (chapéus, peneiras) e de seus pilões talhados em toros de madeira – objetos necessários à vida cotidiana naquela época e lugar, mas que não eram fabricados por qualqueres. O sobrenome, Gonçalves, meu avô herdara de seu pai, Egydio Francelino Gonçalves, mas não de seu avô, que se chamava Manoel Domingos Francelino. Fica então a pergunta: de onde teria saído o Gonçalves? Não se sabe. Aquela heráldica senhora que me desculpe, mas não foi da Espanha. E a julgar que meu tataratataravô era de fato indígena, nem mesmo o Francelino parece ter nascido com a família.

De acordo com a certidão de casamento, meu avô era filho legítimo, mas minha avó, Jacinta Maria de Jesus, era uma filha “natural” (ou seja, sem pai) de Josefa Maria de Jesus – uma negra nascida uns dois ou três anos depois da lei do ventre livre e crescida na fazenda dos Melosos, município de Abaeté. Minha avó, aliás, também nasceu ali, No ano de 1905. Seu pai, um branco, chamava-se Lino Leite. Meu pai, que conheceu dona Josefa quando ela já estava no final da vida, certa vez perguntou-lhe em que ano ela tinha nascido e ela disse que não sabia, pois tinha perdido o batistério. Porém respondeu: “tenho 76 anos”. estava em 1950. Meu pai conta também que ela ajudava a mãe em seus trabalhos enquanto esta era ainda escrava.

No lado materno também tenho algumas informações ainda bem vagas: tanto meu avô quanto minha avó eram filhos de mãe negra e pai branco. Os pais de meu avô não eram casados. Os de minha avó, eram. Minha avó era da família Carmo, vinda da cidade de Moeda. Mas os bisavôs, os homens daquela geração não tiveram um papel muito marcante na construção da unidade familiar. O papel deles parece ter sido o de reprodutores. Meu avô materno faleceu no ano em que nasci. Os velhos, pais dos meus avós, não tomaram conhecimento de que de seus cromossomos nascia um tipo de família com fortes características africanas e indígenas, com a convivência constante de pais, tios, primos, irmãos, cunhados e cunhadas. Famílias matriarcais. Matriarcas que eles fizeram questão de esquecer. E nisso eles foram muito bem correspondidos, pois sabe-se muito pouco a respeito deles.

São esses os primeiros apontamentos para a minha genealogia. Nada de herói fundador. Nada de mito familiar. No fundo, sou um descendente de pessoas de parcas finanças, e muitos trabalhos. Como a maioria dos brasileiros. Tristealegres, provavelmente. Nascidos no país da utopia. O paraíso perdido entre as montanhas.

Mas como eu disse, o trabalho está só no começo. Vejamos até onde consigo chegar. Vejamos de qual povo banto sou herdeiro. Será mesmo banto? Será que descobrirei qual língua meus antepassados canibais falavam?

Enquanto não tenho a resposta, fico com a imagem da velha Josefa, uma senhora com um semblante bem velho, alta e gorda, uma saia comprida e rodada, badalando feito um sino aos movimentos de subida e descida de quem chega andando de muito longe. Josefa aparece no horizonte de uma antiga roça com casa de pau-a-pique enquanto um bando de crianças gritam alegres depois de avistá-la: “evem Vó Izefa!”

aviso aos nautas

há poucos dias, escrevi aqui um texto chamado polemizar ou não polemizar. disse o que pensava, mas de repente, começo a receber certos comentários que me deixam com o pé atrás. como eu disse aquele dia: as pessoas confundem muito. por isso, quero deixar claro que:

1. não sou um pregador de verdades. tenho minhas opiniões. dou importância a algumas delas. não todas. gosto de me afirmar e assumir aquilo que faço. ficar em cima do muro não é a minha praia. mas fique claro que aqui não tem nenhuma verdade à venda.

2. embora a discussão tenha tido o seu começo no blogue da letícia féres, isso não quer dizer que discordo dela. pelo contrário. letícia é uma das pessoas mais criativas e ativas da minha geração, além de uma grande parceira. admiro muito a poesia dela, o humor que ela tem e a paixão com que propõe as coisas que faz. o texto “poesia e mercadoria“, me pôs para pensar. reconheci entre as frases dela, algo que eu tinha escrito aqui no salamalandro. respeito o que faço. achei que era um ato de lealdade, poder escrever o que penso ao meu bel prazer.

3. acredito na força transmutadora de algumas polêmicas. se bem que, na verdade, pensar que o meu prolixo texto causaria alguma polêmica me pareceu quase uma piada, pois não falo nada de polêmico ali. mas eu sei que as coisas não são tão pacíficas assim. propor um diálogo com os escritos dela é para mim uma forma de dar continuidade a uma conversa inteligente. por isso, peço aos comentaristas que não abaixem o nível da conversa com vulgaridades e ataques pessoais.

4. já que é pra citar leminski:

a quem me queima
e queimando reina, valha essa teima:
um dia melhor me queira